Um ônibus, soterrado de preguiça.
27 de dezembro de 2009
Araucária
Um ônibus, soterrado de preguiça.
21 de dezembro de 2009
Conciso
20 de dezembro de 2009
Na vida;
18 de dezembro de 2009
Que seja a aurora
e em seus olhos escuros.
Que seja a aurora como seus olhos,
13 de dezembro de 2009
subterfúgio
9 de dezembro de 2009
Lapso
2 de dezembro de 2009
"Tempo Será"
Com vinho barato reposto de água, os pernilongos atacados.
30 de novembro de 2009
Bom tempo
24 de novembro de 2009
Celeste
20 de novembro de 2009
suplemento
16 de novembro de 2009
Tempestade
...o tempo decorre a maré dos esgotos.
11 de novembro de 2009
semáforo
O meu corpo repousa sobre a quina pontiaguda da banca de jornais. O farol fechado permite que a velha que avisto longe caminhe até que supostamente esperássemos abrir o mesmo semáforo. O verde dos pedestres visa que em poucos segundos abandonemos a margem do lado que saímos para cumprirmos o objetivo de atravessar a rua. O amarelo ao meu ver nunca visou nada. O vermelho é um teste aos motoristas que ruborizam as faces de calor e impaciencia. A rua ocupa, de forma transversal, o mesmo que ocupariam 3 carros de porte médio enfileirados, ou de quinze a dez passos curtos de um jovem. As riscas da faixa de pedestres bem nítidas, recentemente repintadas, o contrario do grande ferro enferrujado, que da base a toda estrutura do semáforo.
O farol sorve o tempo que sorve o suor que de tanto esperar, seca entre as rugas fatigadas dos rostos de todos. Nasce sobre o cansaço um homenzinho verde estacado no farol mais baixo, que habita agora inerte o espaço circular que deveria habitar sempre que sou eu o pedestre. Os passos ligeiros pisam como poeira leve o piche levemente derretido do desenrolar da rua quente e se levam ao destino que há do outro lado da rua. Os compromissos estão de fato cada vez mais próximos de acontecer, as reuniões, encontros, o trabalho, a doce volta para o lar.
Tinha em mente cores, agora se revolvem como dançarinos extasiados.
9 de novembro de 2009
Porfia
O Sol havia se congelado de baixo de nossos pés, onde os vermes degustam fibra por fibra dos cadáveres já encobertos de terra, causando aquele álgido vento que voraz acerta os rostos que um dia também servirão de pratos prontos. Plácidos, os mortos, serenos. E o sereno debruçava-se como um lençol úmido na terra. A pequena distancia separava-nos como quilometros, o silêncio era a única voz que conversava desesperadamente.
O banco, e seus olhos fixos para o exterior de tudo, para o exterior da janela, reclusos para a vida. Já os meus olhos viviam os momentos de teu reflexo na vidraça embaçada, tentavam decifrar a felicidade e a infelicidade de cada sorriso entreaberto, piedoso, frio.
6 de novembro de 2009
pensamento
É sempre o tempo em seus olhares. E tudo é sempre perdido em teus olhares. Os seus olhares se perdem no tempo. O tempo se perde nos teus olhos. Tende piedade dos encantados, são eles os que choram o mar em que repousas. Sei que és o prenúncio do terrível fim, a luz que atormenta a dor, quem confessa os desprazeres da carne. Mentem os que dizem que não és a morte que a todos envolverá dentre os milênios submersos na ressurreição do salvador.
Se te querem é porque são loucos e, loucos são os que não querem.
4 de novembro de 2009
Flauta
Teu rosto translúcido, distante, presente. Antes melhor sem conhecê-la.
Muitos cafés pra tentar desvendá-los, muitos calos de tentar escreve-los, muito desejo sempre que os vejo, e nada. Os impossíveis em teus cabelos que são o tempo quando se unem com o todo. Você é como o arco-íris que desfaz a chuva quando desfaz a infância dos meninos. Teu inteiro se subdivide em parcelas de sensualidade. Apática roedora de corações.
És o maligno quando atenta o puro, implantado na face de uma bela mulher.
2 de novembro de 2009
1 novembro
30 de outubro de 2009
Empíreo
27 de outubro de 2009
Garnel
Credo! - Dizem algumas - No fundo gostam de teu forte peito liso ao vento, transbordando tua masculinidade fictícia e seu sorriso meigo. Um pobre amante das palavras, gênio delas.
Garnel é como um faisão, tirando as cores e o penteado.
26 de outubro de 2009
à dois
Era tudo uma coisa só, a brisa, talheres, o ronco dos carros do lado de fora, o trio, os nossos corações.
19 de outubro de 2009
Letreiro
17 de outubro de 2009
script
13 de outubro de 2009
Verdade
Será que um dia poderei dizer verdades como quem descreve o clima - hoje as tênues nuvens chuvosas conquistam espaço no verão - convicto como a quem afirma sede ou fome, como a quem idolatra imagens e estatuetas esculpidas por homens. A verdade por ser abstrata, é ampla como um mar de espécies que desabrocha em cada opinião e pessoa diferente.
A verdade idealizada é a menos oprimida, vendo pelos aspectos de que é ideal, sendo para cada um, uma, é a verdade dos sonhos, dos anseios, dos desejos. A verdade natural segue o ciclo da vida, é o tempo e o espaço em que vivemos, considerando os feitos nefastos do homem na terra e o açoito na história que se passa. A verdade formal é a simples ausência da mentira, e seu oposto é a desavença de fatos que ocorreram realmente, com fatos repassados mais algumas orações, pontos e vírgulas acrescentados. E a verdade religiosa, que baseia-se em fé, pergaminhos e medo.
12 de outubro de 2009
Reunião
8 de outubro de 2009
Sorria
6 de outubro de 2009
30 de setembro de 2009
A vida em folhas
29 de setembro de 2009
28 de setembro de 2009
Miragem
Se horas em uma longa fila do banco são minutos quando te tenho por perto, pense então no amor eterno. Se é que há o eterno quando o tema é amor, quando a criminalidade cresce a cada esquina e cruzamento, sendo assim mais fácil que se roube corações, ainda mais os abandonados. O subseqüente do abandono é talvez o livre, pois livres são os que se perdem no labor do amor.
Haja talvez um laboratório para isso, talvez teses, pesquisas não concretas ou já conclusas, haja talvez razão para se deixar lacerar o músculo cardíaco em finas fatias, distribuídas como bacon para a eternidade prometida em cada paixão verdadeira. Porém, é paixão, termo passageiro de prenúncio sofrido.
Se o tempo é o ocaso do dia, a eternidade é a meia-noite, que carrega o início, a aurora, distribuída em luzes tão fortes que, quando o tempo nulo surgir como poente, essas luzes resistirão ao breu e iluminarão o espaço percorrido até um beijo, esse sim será eterno.
21 de setembro de 2009
Agora chove
Agora chove:
Pequenas gotas derretidas de gelo, caindo direto contra as folhas e a terra do quintal.
Agora chove:
O que ontem não choveu e anteontem deixou de sobra.
Ainda chove:
O rascunho do que o céu tem pra passar.
Chove fraco:
O cansaço do tormento frio que vem de cima.
Chove mais:
E mais, até que um dia pare de existir quem da a vida.
Chove vida:
Em doses precisas de água, de tédio, de inverno, de amor.
E mais nada além de chuva:
e chuva, e chuva, e chuva, e pouco do raro amanhecer do Sol.
Pois chove:
sem a permissão de ninguém, sem a gratidão de ninguém, sem que ninguém assista atencioso o espetáculo que há nas gotas da chuva, no brilho da chuva, no som da chuva, e na chuva, em seu total e explícito excesso de loucura.
17 de setembro de 2009
bela
O fardo pesado de um ontem composto de todo o passado ardente
O receio de acordar em um mundo incolor
A vontade de acordar vivo no sonho que só teus olhos transmitem.
A vontade de não acordar dos sonhos que te sonho linda, que sonho tua voz a palpitar minha cabeça e a falar meu coração.
Sonho de belo além de ti, nada, pois nada existe.
15 de setembro de 2009
do Olhar
Perco-me ao olhar fundo os teus olhos fundos, e me encontro quando vejo-os brilhar. E quando as janelas abertas de tua memória desvanecida dão espaço para lembrar de minhas palavras iludidas em prazer.
Conheço cada dobra invisível de tua retina e cada cílio que se vai ao vento.
Tudo que não era ela se desvaneceu
hipóteses
De que adianta fechar os olhos se não for para descansá-los de tua face?
Ou sobrevoar no escuro o teu corpo desnivelado e curvo.
7 de setembro de 2009
4 de setembro de 2009
Tua falta VIV
Há de solver o Sol quem sabe a Lua
já sem luz e sem o cinza que consome.
Há de pensar e viver o indiscreto que
transborda em teus lábios e olhos d’água.
As noites hão de voar pelos compassos avulsos
das canções que entoam ao teu nome.
E enfim render-me aos deleitos de tua alma
fria e opaca, traída, que murmura desejo.
Onde mas repouso puro fora de teu sorriso?
Além de quando inspiro o teu odor de flor e
sugo as pétalas rosadas como a maçã de teu rosto.
Não só pelas ruas perdidas em tua pele branca ou
pelas descobertas que faço sempre em teu olhar
mas, pelo vil que reside na falta da tua presença.
1 de setembro de 2009
Faz Nouveau
Os rabiscos contornam um par de mãos centralizado, oposto a um feixe reluzente de luz que explode riscas perfeitamente postas para todo o retrato. Das mãos seguem braços em forma de uma gaivota, completando o tronco de duas pessoas que parecem seguir para lugar algum, juntos. Os cabelos da mulher caem sobre o pescoço, divididos em dois tons diferentes, devido a luz que vomita sombras por todo o complexo de fim de tarde. O desenho do homem segue, e diferente da mulher, o rosto está virado de perfil e a pele se desfaz como a areia em que pisam os pés que acabam de se formar.
Posta a fúlgida linha do horizonte, impõe-se a ordem de plantar árvores no interior do quadro. São três delas, distantes como quem acaba de brigar, no extremo leste e extremo oeste, e uma centralizada na parte superior, causando uma sombra sobre o enlace dos dedos das mãos do par. As árvores são como as pessoas, porém, inclinadas sempre apontando o centro do quadro, com folhas em forma de grandes serpentinas que debruçam o verde sobre o tronco incolor. As nuvens brancas tomam espaço pelo infinito da pintura que se vai além do que vaga pela minha imaginação, e habitam grande parte superior da linha do horizonte. Agora se completa o quadro apenas com os detalhes finais.
Vivo. O quadro construído enquanto suspirava por conta do motivo que me fizera imaginar o quadro, está vivo. Pássaros surgem flutuando como esboços velozes, e somem do papel, o vento vai levando a areia da face do homem, que se desfaz de forma rápida. O corpo, contagiado pela vontade de sobreviver, tenta segurar os restos que se misturam com o chão. E o vento leva tudo embora.
O último pouco de areia que ainda tem forma de mãos, solidifica-se e toca meus olhos reais, se finda a espera pelo ônibus e o vento que lhe trouxe, também trouxe um cisco que de encontro com meus olhos abertos, acordou-me das imagens que crio de nós dois, quando penso que apesar de tudo, a pena cobrirá a tristeza que obviamente me invadirá eternamente por nunca te ter.
31 de agosto de 2009
Teus sentidos
Quando nossos olhares distantes enfim se encontram, desfazem-se avermelhados e disfarçados com um sorriso apenas. Sempre que sorri, sorrimos juntos sem que ao menos você saiba, sempre que depressa pranteia o vazio de teu peito, choramos juntos sem que veja as lágrimas que escorrem pelas minhas mãos. Outra vez nos encontramos em olhares, e, a sombra de teu lábio abre-se espontaneamente em idéias tão belas que corrompem além da alma, a consciência que nunca tive ao teu lado.
As partículas de teu aroma de morango encobrem o mundo e o submundo, incendeiam o universo paralelo que há em cada som que lança na perseguição desvairada de fazer-me amá-la. Respiro e espiro os resquícios do que ainda vagava pelo espaço em que passou ligeira, passou e mais nada. Respiro ainda mais a sobra do que deixou plantado em teu espaço, enquanto trocávamos além de palavras, inocentes segredos absolutos.
Todos os dias és a favorita. Todos os dias que te abraço, não há tempo ou espaço, duração ou caminho, apenas teu abraço, que sem ele, não teria nada. Todos os dias flutuo em meu próprio pensamento que, quem conduz é você. Todos os dias enquanto dorme teu cansaço, te sonho no meu. Todos os dias entendo o sinal de teus lábios que negam os meus. Todos os dias encerro te olhando de olhos fechados. Todos os dias são poucos só de te ver. E suas derradeiras palavras são as mesmas todos os dias, e cada dia mais me encanto por elas.
27 de agosto de 2009
Voa, voa joaninha
Seguia atento teus passos e tuas patinhas meigas que provocam a leve sensação de que tudo que se diz joaninha deveria ser lançado para o diminutivo, teus vários passos que percorriam centímetros de distância. O ônibus repousa bem próximo a faixa de pedestres, e em desfoco, sinto ser observado por uma senhora enrugada que, sentada na frente do portão, em uma cadeira que balançada o ritmo de pernas obesas cochilava de olhos abertos, observava explicitamente curiosa o que eu observava. Sorri para a velha, a velha sorriu para mim. E nossos olhares de desmancharam quando o farol se abriu. A pequena joaninha desfilava tuas pintas pretas para o mundo ingrato que havia tomado teu espaço. As asas abertas pareciam quebradas contra o vento, se mexiam como numa dança extasiada e natural das folhas das árvores altas.
E uma evidente decisão foi tomada pela joaninha, ela se desfez dos entraves que lhe repugnavam a volta para a natureza e voou espessa. Tive a imagem de um ponto escuro se apagando sobre as casas humildes de meu bairro, o ponto que sumiu quando se pôs em frente ao Sol. Teu corpo avermelhado e coberto por pintas negras se misturou com o incolor do infinito do céu, se misturou com as nuvens claras e abstratas que vagavam limpas pelo ermo do espaço sideral.
26 de agosto de 2009
Arco reflexo
Também há um armário, semelhante à torre de piza, inclinado como um velho carregador de sacos de feijão aposentado, o armário ocupa boa parte da pouca área que resta da passagem. Com quilos e mais quilos de livros impostos à força o armário permanece estável e vasto de lembranças adoráveis dos brinquedos que guardava em seu interior empoeirado e sinistro, como o crânio fictício que vive largado no alto de teu frágil corpo amadeirado.
Cheguei ávido, acelerado, e me deparei a um silêncio intenso e agradável que soava no corredor alérgico de limpeza. E tudo era o pretexto da inigualável dor que seguia naquele episódio, tudo era fato para averiguar se meu pé macio era mergulhado em algum tipo de metal resistente.
Já ofegante, perdi o equilíbrio nós pés da penteadeira e logo mais o encontrei nos braços do estorvo que era o armário, e devido a leve descontração, meu corpo ainda não havia encontrado o real repouso e seguia em frente desenfreado até o outro extremo no armário, quando num opaco som de madeira fina minha raiz nervosa dorsal transpassava veloz a mensagem enviada pelos nervos aos músculos que completariam o arco reflexo.
O universo que girava silencioso, agora é conduzido pela voz que pressupõe maldições sobre o encontro dos meus pés com os do mortífero armário empoeirado.
25 de agosto de 2009
Peso morto
Nem a cor das luminosas plantas da minha imaginação ou os discos que um dia ouvi, tem a presença do silêncio que tanto falta. Nem o topo nebuloso de um pico e nem o extremo fundo do oceano gelado tem o mistério que um dia teve. Nem o doce pleno dos lábios morenos apaixonados ou o mel colhido artesanalmente, transmitem o sabor que não mais existe. Nem a nudez ou o céu azul, a maçã ou o pêssego, o colar de ouro ou a pedra preciosa.
E tudo vive um redor isolado, tudo cheira um cheiro entupido, tudo confia na inocência mansa, tudo copia o que já foi copiado. E eu, declaro sem motivo algum a ausência de nada, declaro o pacato que transborda aí a fora. Apenas me falta faltar algo, para que a falta esvazie meu peito de companheiro.
Quero mudar o mundo. Quero dominar a arte que me foi imposta. Quero ajudar alguém que como eu, precisa de ajuda, e assim ajudar-me a completar o que quero. Quero parar de escrever asneiras sobre nada e quem sabe, escrever o que um dia de fato valerá algo.
E em verdade, meu único desejo real, meu único anseio distante... é ser válido.
24 de agosto de 2009
Você foi
19 de agosto de 2009
E ontem...
18 de agosto de 2009
Recanto do Sol
17 de agosto de 2009
Cena de teu drama VIII
flores de um vivo e intenso azul anil
azul como o céu e como olhos, não os teus,
como a verdade de quando não mentes.
E sempre irradia o Sol com luz e calor
resplandecendo o lírio que tu possuis,
resplandecendo teu olhar de choro
e as lágrimas que viajam teu rosto nu.
Olhe o velho bosque já sem céu nem apelos,
sem ti, que lanças o lírio para longe.
Sou como quem um dia já morreu de dor,
como fim de comédia sem aplausos e risos,
a crua comédia mal sucedida de teu drama
o horror de tua dramaturgia mal interpretada.
13 de agosto de 2009
Hoje VII
Hoje é hoje, calor ou frio é sempre hoje
é, pois a madrugada declarou isso ontem,
ontem que há horas atrás também era hoje
como em horas amanhã também será.
Hoje corre livre pelo tempo eternamente,
por ser a mais exata referencia da história.
Hoje acontece o que o amanhã carregará
sendo chamado de hoje por um dia existir.
É hoje e enquanto pode ser será, até que mude.
Foi ontem hoje e já deixou de ser pois hoje começou.
Será amanhã hoje com o fardo de todo agora.
De nada vale afobar-se para o fim do dia
tanto quanto o anseio pelo amanha pois,
hoje será eterno, luas vão passar e será hoje.
11 de agosto de 2009
Rafaela VI
Rafaela, soa leve e opaco como ondas
e tece uma linha abstrata de risos em seu fim.
Nasce dos frutos proibidos as letras
que carrega teu nome de flor silvestre.
Teu amor confundido em amizade vibra
o longo caminho seguido até um abraço.
E seguido do abraço vem o áspero amor
que esquenta as manhãs geladas ao teu lado.
Sinto verdade em tua amizade grosseira
e carrego-a sempre eu meus pensamentos.
Tua voz penetrante e irritante vaga sempre,
vaga em seu sorriso escandaloso e lindo,
em seu silencio constrangedor e raro,
em teu carinho bruto, que tanto amo.
10 de agosto de 2009
vasos inseguros V
borboleta colorida da floresta de outono,
teu perfume revive o vácuo das plantas e
destrói as parasitas que infestam o jardim.
Passa o lodo ao ofício do tempo, passa
e teus olhos inquietos perseguem outro.
Quando noites a fora eu, sábio estabanado
jurava a mim o teu calor intenso e desejável.
Dias de alucinação, noites em branco, orações
e o medo de ser enganado pela isca que há
em teus anzóis de beijos. E entre os amantes
celestes que já te amaram, os poetas da noite
de sutis lábias engasgadas, serei apenas um mais
em sua trama trapaceira. Não tramas, são meus olhos.
O canto das flores IV
De tua alma as mais dóceis canções,
De teus olhos a imensidão do azul noturno.
As flores cantam dóceis a tua noite de sono.
Das flores, o correto aspecto de cantar seu nome,
de viverem da tua chuva, de seguirem teus passos.
A primavera regressa e já murchas as flores
somem infelizes cantando o adeus de teus olhos.
A lágrima que escapa do seu globo escorre
e lenta percorre o caminho te sua face branca,
quando enfim se cai sobre o jardim morto.
A terra te rouba voraz para baixo, quando
das velhas flores mortas surge uma floresta,
cheia de vida. Eis a recriação do mundo.
8 de agosto de 2009
Foi, és e será III
e que as aves clamam teu sopro quente.
Me esqueci também dos teus olhos
e dos teus lábios que nunca foram meus.
Porém não me esqueço de tua ternura,
não me esqueço dos teus fios de ouro
e da breve linha que percorre tua voz
até soar solene em meus ouvidos.
Amor meu, ainda não és minha o quanto
sou teu. Ainda não és filha de meu sonho,
como sonho ser dos teus sonhos e pensamentos.
Talvez não tê-la é ter-te bem pouco,
seja entre teus olhares e gracejos
ou em meus sorrisos avoados para os teus.
7 de agosto de 2009
Aos teus cabelos de Sol II
ande para que eu te acompanhe,
durma para que eu te observe,
viva para que a vida valha.
Seus lábios molham sortidos os meus
como se num sonho de toques precisos.
Tua pele de maçã preciosa busca refúgio
e vivo como uma fortaleza indestrutível.
E as horas vagas vagam já raras
no tempo que só há tua voz de lírios,
lírios que uivam teu nome de flor.
Nem o ouro nem a noite reluzem como tu,
nem a realidade que escrevo é real,
apenas a de te amar como quem respira.
4 de agosto de 2009
Venta mais I
A ventania assombra os canteiros da cidade
carrega junto, as folhas, flores e canções entoadas.
Pesa como uma garoa acelerada que transpassa
das doses de finas gotas esquecidas pelas nuvens,
para o chão encoberto de flocos de gelo derretido.
Vive como quem não vive só, vive infeliz,
a praguejar as malditas poeiras impostas.
Envelhece enquanto viva e se faz jovem à sua
tardia volta]
Sobrepõe-se a morte que carrega em doenças e
barracos derrubados. Vento que venta a ventania
volumosa, que não varia e vejo, como não vario os Vês.
Palavra invisível que carrega palavras em seu desenrolar
gelado ou refrescante, em sua órbita abstrata e, constante,
como a velha seringueira que dança tua música agradável.
31 de julho de 2009
A estação qual nunca chega
No fim do turbulento dia, já beirando a madrugada. Sujeito a uma lamparina que constantemente oscila e curioso para saber o que se passa na sala de estar, há um jovem escrevendo sobre a situação em que escreve.
Um dia após o outro e em todos os lugares, não me canso desse romantismo barato.
Não me canso de ser barato, e fácil, e exagerado, e incomum, e inconsequente, e errado, e verde. Assim. Meio verde.
30 de julho de 2009
Bloco C apt 66, ou algo do gênero
Bela visão tem aquele apartamento novo: um bosque, plantações de alguns temperos exóticos e bancos de madeira ao ar livre, para livre e completo acesso dos casais carnais. O vento forte de um sexto andar, uma sacada ampla e bem arejada e o gosto de saber que tudo ali não passa de um desejo.
Te espero na cobertura. sozinho...
27 de julho de 2009
A farra
Uma tênue luz solar ainda domina grande espaço no horizonte infinito da cidade. A porta suja de um bar, fechada como sempre. Os ambulantes finalizando seu trabalho e contando seu lucro, resultado do trabalho intenso do dia todo. Os donos das lojas locais batendo com força as pequenas portas de alumínio contra o chão. Os mendigos, estáticos, apenas com suas canequinhas para armazenar o dinheiro conseguido ao longo do dia. Os compradores felizes e infelizes, satisfeitos e insatisfeitos ao mesmo tempo. As velhas costureiras, que vendem seus tecidos bordados, conversando entre elas e arrumando seus carrinhos para voltar para casa. Agora, a noite vem a pouco tecendo uma linha escura no céu e como em uma cena de cinema, os participantes dessa paisagem semi-noturna dominam a rua, visto de frente como um desfile do exército, esbanjando organização e ordem. Ouvem fortes estalos, é a porta do velho bar se abrindo.
A lua já tão próxima, ofuscando o reflexo do Sol e refletindo-o para a rua escura, tornando-a uma rua clara e cheia de vida, como um jardim em plena primavera. E agora, eufóricos, os passos do batalhão de cidadãos causam um estrondo sincronizado. Quando todos se desligam e com olhares fixos para frente, param. Feito cimento concretizado.
Um chiado cisca os ouvidos atentos do batalhão de estátuas, é a vitrola do velho bar soando. A curiosa cena de cinema agora se desfaz, a organização e a ordem tornam-se vadiagem e boemia.
Os cidadão em sincronia atiram-se para todos os cantos da rua, correndo feito loucos, e como jovens delinqüentes berram e quebram as vidraças das lojas sem portas protetoras. Agora fora de sincronia. As velhas costureiras são as primeiras, arrancam suas roupas por completo e vibram sem motivo algum, urram e despedaçam suas peças intimas, tornando-as como retalhos recortados, as banhas pulando, nojentas velhas. Todos os homens embebedam-se loucamente e atingem-se com as garrafas de vidro quebradas. A música baixa da vitrola se transforma em uma batida contagiante que leva todos os personagens a dançar, histéricos e apaixonados.
Agora todos nus, deitam e tornam do chão um grande colchão. Como era de se esperar, amam-se atirados no asfalto áspero. Como se na grama, rolam um sobre o outro marcando de vermelho as partes do corpo que raspam vorazmente no chão. Todos farreiam, exceto o dono do bar, que mantém a postura ereta e de braços cruzados na porta de seu bar agora aberto, cheio e infestado de malucos.
Aquela suculenta farra parecia ser eterna, até que da noite surge uma luz alaranjada, era o Sol. O dono do velho bar desliga a vitrola lentamente, todos os cidadãos tornam-se estátuas novamente. Após alguns minutos carregando os corpos inertes para fora do bar, fecha as portas e desaparece.
Todos voltam a si e, pasmos desviam um dos outros procurando desesperados suas roupas largadas pela rua. Os olhares incessantes e duvidosos, o desespero de ver-se nu em público e a falta de vontade para trabalhar em plena terça-feira de manhã. A rua começa a encher.
26 de julho de 2009
a garoa, a vidraça, você
Essa chuva fina, de poucos alívios que claramente corrompe os compromissos de um domingo de Sol. Essa chuva fina e de poucas palavras, chuva que quando contra a luz, produz incessantes traços e sem luz não passa de um som. O som das rodas molhadas dos carros passando velozes na avenida livre, o som das gotinhas unidas acumuladas nas folhas do Ipê indo contra o chão, o som dos galhos se espancando sem sentido, o som que a rua vazia produz e o som que o vento traz aos meus ouvidos, um som gelado. As gotículas de água debruçadas uniformemente sobre a janela e um sopro gelado que esfria os meus braços descobertos, junto ao sopro quente do doce de abóbora que lembra o meu passado.
A chuva clareia as idéias de uma mente seca e recorda chuvas em que não estava só. Lembro do seu pezinho sobre o sofá, macio, de tua santa delicadeza comover-me como sempre, comover-me quando escrevo e comover-me enquanto chove. E agora chove. Comovido, lembro da primeira vez em que te vi com olhos incomuns, seus olhos incomuns, incomuns como a chuva que cai agora, sem força ou forma alguma, sem brilho e sem direção, com gotas que tropeçam em gotas e se unem, a chuva que destruíra os sonhos de um domingo divertido, não para mim. A chuva que, garoa fina sobre a vidraça entreaberta da minha sala.
As doses de um álcool imaginário, tragadas de um ar puro me consomem, me entrego imediatamente aos vícios: pensar, escrever e consumir tudo, exceto coisas que viciam. Consumo algo para relaxar e assim busco pensar em você, consumo algo para me aquecer e lembro o que de fato sempre me aqueceu, consumo perfumes enquanto seu cheiro ainda permanece em minha camiseta, consumo altas doses de acordes e todos soam nossas músicas, consumo, consumo e consumo, enquanto o meu único vício real é você. Descubro que não tenho vícios, apenas não te tenho mais.
24 de julho de 2009
Valsemos
O som arrastado em tercinas soa lento, é a fiel valsa, companheira dos apaixonados. Os pares escolhidos à dedo posam para fotos, sorriem para diversos os lados e, agarrados um ao outro, dançam a música serena e romântica que as raízes do destino lançaram.
A valsa desabrocha, enche o espaço livre do salão com seu aroma em palavras, como um violino, dançamos dignos. Tudo que é lindo meu par transcreve em seus passos de anjo: a inspiração dos ventos, a lua que brilhava do lado de fora, as gaivotas que cortam o céu, as espumas do mar e o desejo que tive da valsa ser eterna. Dois pra lá, dois pra cá. O nosso assunto se desenrola a pouco e quando menos percebo estou vidrado em seus lábios que se movimentam enquanto fala, e em seus pés que entrelaçam o meu, em seu vestido longo enroscando no meu paletó, em seu tom de voz. E ouço de sua boca um sussurro que pede perdão por pisar meu pé, não liguei, os pés delicados de uma Cinderela não interferem com dor, apenas com a doçura de uma valsa concedida. Ah, nossa valsa concedida, bela valsa, tem a ternura de uma borboleta e a arrogância de um açougueiro, viaja com turbulência os corações e rostos novos, como o seu.
À pouco a dinâmica alta da valsa rareia e torna-se uma leve finalização. Enquanto o som da valsa é baixo conversamos feito dois tolos, o tom veludo de suas palavras penetra ligeiro em meu ouvido, porém, nada entendo, todo minha atenção torna para seus olhos emocionados e envolventes completando a valsa à esplêndida emoção. O fim da valsa vem com os violinos em nona e o piano leve, tecendo uma escala acidentada e repleta de vida. É o fim da dança e todos os pares espalham-se pelo salão, te espero em clara homenagem. Aquela valsa cessa. A nossa valsa, é eterna.
Imortal
Como todos os que escrevem, escrevo. Escrevo como desenha uma criança que, de seus borrões sem forma, formam para ela algo, algo de valor intenso que pulsa para fora de seu corpo frágil. Tal como escrevo, sinto a doce gota de cada palavra que penetra na língua confundindo assim, os azedumes da vida. Tal como sinto, vejo, a página cheia de uma grafia corcunda sendo completa pelas minhas mãos cascudas e ágeis, seguindo o ritmo do raspar do grafite áspero ao papel amassado. E para seguir uma ordem exata das fases também cheiro, também toco, beijo e me inspiro, me inspiro quando te sinto, quando te vejo, quando sinto teu cheio, me inspiro quando te toco e mais ainda quando te beijo. E me inspiro quando te sinto, e te sinto quando te escrevo, te escrevo quando te beijo, te beijo quando te toco, te toco quando te cheiro e te cheiro enquanto és viva, e para mim, és imortal.
23 de julho de 2009
sem voce
Enfim já é noite, e
o cheiro úmido do orvalho
não sacia a minha sede
de tê-la intensamente.
a noite, por escura, surge
inesperada, de braços abertos
para envolver-me brutamente
com seu medo e solidão.
Ah noite, lembro-me de quando
a encontrei em você, e você amanheceu
apagou-se com a luz de um Sol
que como meu amor, também é sua.
E como as aves você se foi,
sem pensar, apenas agiu, fugiu
abandonando-me sozinho, para
mais uma fúnebre manhã sem ninguém.
13 de julho de 2009
Paralisia
Olho-te pela fresta da parede esburaca do cômodo vazio e vejo tua imensidão. Aquela que quando toco desfaz-se do imenso e esvai para onde meus olhos cansados não enxergam mais. Como o veneno das víboras de um brejo ralo ao morder os pés de uma infeliz vítima, percorrendo pelos vasos dilatados até encontrar a bomba que rapidamente espalhará a maldição para todos os seus membros.