27 de agosto de 2009

Voa, voa joaninha


A transparência da janela me permitia seguir os passos lentos da joaninha que caminhava, lenta ou morta de cansaço. Teu corpinho gordo se arrastava sutilmente pela vidraça do banco individual do ônibus, se arrastava mesmo com o voraz vento que contra o casco colorido batia sempre que o ônibus acelerava. E paramos no ponto. Sempre que possível movia-se para cima, na esperança talvez de entrar pela janela aberta. O ônibus volta a correr.

Seguia atento teus passos e tuas patinhas meigas que provocam a leve sensação de que tudo que se diz joaninha deveria ser lançado para o diminutivo, teus vários passos que percorriam centímetros de distância. O ônibus repousa bem próximo a faixa de pedestres, e em desfoco, sinto ser observado por uma senhora enrugada que, sentada na frente do portão, em uma cadeira que balançada o ritmo de pernas obesas cochilava de olhos abertos, observava explicitamente curiosa o que eu observava. Sorri para a velha, a velha sorriu para mim. E nossos olhares de desmancharam quando o farol se abriu. A pequena joaninha desfilava tuas pintas pretas para o mundo ingrato que havia tomado teu espaço. As asas abertas pareciam quebradas contra o vento, se mexiam como numa dança extasiada e natural das folhas das árvores altas.

E uma evidente decisão foi tomada pela joaninha, ela se desfez dos entraves que lhe repugnavam a volta para a natureza e voou espessa. Tive a imagem de um ponto escuro se apagando sobre as casas humildes de meu bairro, o ponto que sumiu quando se pôs em frente ao Sol. Teu corpo avermelhado e coberto por pintas negras se misturou com o incolor do infinito do céu, se misturou com as nuvens claras e abstratas que vagavam limpas pelo ermo do espaço sideral.

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